domingo, 9 de fevereiro de 2014

Saudade

Casa arrumada, cheiro de comida gostosa na cozinha, zoada, bagunça, conversas intermináveis, risos soltos, arengas, reconciliações ... Geralmente é sempre assim quando a gente se reuni em família nos finais de semana. Dizem que encontro de família é sempre bom, mas passou de oito horas seguidas juntos, pode ter certeza que sai confusão.
Interessante como um simples ato tão corrente, simples e singelo na vida de tantos faz uma falta enorme na vida de outros. Desde que me me assumi como homossexual meus encontros em família tem sido tensos e em muitos casos, nem existido. Depois que sai de casa a situação piorou relativamente. Minha avó materna, que me criou como uma mãe, ainda não veio aqui em casa, minha tia e mãe vivem arrumando desculpas e minha convivência com a família do meu pai, que já não era tão regular, se tornou inexistente.
Costumava muito ir à minha cidade natal visitar meu pai, meus avós e meus padrinhos. Dia de domingo era aquela alegria. Adorava passar o dia sem fazer nada na casa deles. Contar como estavam as coisas aqui em João Pessoa, escutar minha avó reclamar das chatices do meu avô, ouvir meu pai murmurar sobre o cansaço sem fim dele, almoçar aquela lasanha que só minha madrinha sabe fazer ... Coisas tão bestas que para mim faziam toda a diferença. Vai fazer dois anos que não sei mais o que é isso.
Uns não querem me ver, outros não fazem questão e eu vou deixando as coisas acontecerem e fingindo que não me importo com suas atitudes. Vou empurrando com a barriga. Afinal, eu escolhi seguir caminhos diferentes. Mas mesmo já sabendo das consequências de minhas escolhas, ainda assim é duro suportar a falta que eles fazem em minha vida. Me pergunto sobre o amor. Se existiu na verdade amor. Pois é estranho entender como um sentimento tão puro pôde se transformar em rejeição. Como uma promessa de amor e cuidado pode ser descartada. Até entenderia se minhas escolhas ferissem diretamente esses, mas elas só afetam a mim mesmo. Mesmo sabendo de todo contexto cultural e de idade ainda assim é difícil compreender como alguém que é sangue do meu sangue quebra um pacto e uma promessa desse tipo por egoismo e preconceito.
Deus é testemunha e sabe o quanto não quis que isso acontecesse. Queria muito compartilhar da minha felicidade com eles, mas entre ser hoje completo, sendo quem sou e me reunir em família como antigamente cheio de máscaras, prefiro sentir na pele o descaso e o repúdio dos tais.



(Texto escrito em 09/fevereiro/2014)

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